Não é novidade que o fato gerador do imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS) é a prestação de serviços constantes na lista anexa à LC 116/2003. Também não é surpresa que a base de cálculo do imposto municipal é o preço do serviço (artigo 7º da LC 116/2003).
As legislações municipais, que por enquanto ainda estabelecem as regras sobre ISS em cada município, disciplinam o lançamento e o momento de pagamento (critério temporal) do imposto. No município de Salvador, por exemplo, o ISS é devido “no mês, com a ocorrência do fato gerador“, nos termos do artigo 105 da Lei Municipal 7.186/2006. Na hipótese de recebimento antecipado do preço do serviço, inclusive, deve o respectivo documento fiscal ser emitido e o imposto recolhido.
É exatamente o momento da emissão da nota fiscal que pode gerar dúvidas, seja para o prestador quanto para o tomador dos serviços.
A emissão de nota fiscal é uma obrigação acessória do contribuinte prestador do serviço, que não se confunde com a obrigação principal de recolher os tributos nela (nota fiscal) destacados. A ausência de emissão de nota fiscal não descaracteriza a ocorrência do fato gerador da prestação de serviço constante na lista anexa LC 116/2003.
Não é incomum que o prestador de serviços, mesmo com a realização do fato gerador do ISS (prestação dos serviços), retarde a emissão do documento fiscal respectivo, sob a justificativa de que o tomador não realizará tempestivamente o pagamento contratado. O objetivo do prestador, nessas situações, é evitar o imediato ônus tributário que terá de ser suportado exclusivamente por si, sem a contraprestação pelos serviços prestados.
Infelizmente, ao menos no âmbito jurídico, uma coisa nada tem a ver com a outra. A emissão da nota fiscal, obrigação acessória do prestador dos serviços, relaciona-se com o fato gerador da prestação dos serviços, e não com o pagamento da contraprestação pelo tomador dos serviços.
Essa análise é relevante porque, comumente, a prestação de serviços é lastreada em contratos (escritos ou verbais), nos quais são ajustados a incidência de juros moratórios e a penalidade de multa por atraso na hipótese de inadimplemento da obrigação financeira.
Tratam-se de acréscimos acessórios contratuais, lastreados na legislação cível, mas que, a rigor, não se confundem com o preço do serviço.
Imaginemos o seguinte cenário hipotético: prestação de serviços ocorrida em abril de 2021, não tendo o prestador cumprido a sua obrigação acessória de emitir a nota fiscal contra o prestador naquela ocasião, por receio de não receber tempestivamente a remuneração contratualmente ajustada.
Somente em abril de 2024, após discussão judicial, as partes convencionam o pagamento do valor do serviço e de parte dos acréscimos moratórios previstos em contrato. A nota fiscal que será emitida agora em 2024, relacionada ao serviço prestado em 2021, deve indicar o preço contratualmente estipulado pelos serviços ou o valor acordado, que engloba parcelas contratuais distintas do preço do serviço?
A nota fiscal deve registrar o preço do serviço, base de cálculo do ISS. A emissão extemporânea do documento fiscal não autoriza a alteração do preço do serviço pactuada entre as partes, decorrente de serviços já prestados. Eventuais acréscimos de mora e multa contratual não compõem o preço do serviço, não devendo, portanto, serem oferecidos à tributação do imposto sobre serviços de qualquer natureza.
Não obstante, devem tais acréscimos ser reconhecidos como receita pelo prestador do serviço, havendo a incidência do PIS, Cofins e também IRPJ e CSLL, mas não objeto da nota fiscal de prestação de serviços, sob pena de tributação pelo ISS de quantia distinta do preço do serviço pactuado.
Fonte: Conjur, por Monya Pinheiro