A reforma trabalhista vai endurecer as regras para contabilização de horas extras. O texto, que começa a valer em novembro, detalha as situações em que, caso um funcionário fique mais tempo na empresa – antes ou depois do expediente -, não poderá cobrar remuneração adicional. Entre os itens listados estão atividades como estudo, práticas religiosas e “atividades de relacionamento social”. Advogados da área trabalhista afirmam que a nova legislação dá mais segurança a empregadores, que reclamam de processos judiciais indevidos. E também alertam para a necessidade de se firmar acordos por escrito, para evitar fraudes dos dois lados: empresas que se neguem a pagar e trabalhadores que tentem receber a mais.
A restrição vale apenas para a contabilidade de horas extras. Apesar de citar itens como “relacionamento social” na lista do que não conta nesse cálculo, as paradas para o cafezinho ou ir ao banheiro não estão ameaçadas pela lei. Isso porque o texto deixa claro que as situações descritas não serão computadas como “período extraordinário” à disposição do empregador. Ou seja, não vale para o que acontece dentro do horário de expediente.
Segundo especialistas, um exemplo clássico é o do funcionário que prefere chegar mais cedo ou sair mais tarde para resolver problemas pessoais, como estudar para a faculdade ou pagar uma conta pela internet. Também há casos em que o empregado prefere esperar um pouco para evitar a hora do rush. Por estarem nas dependências das empresas, alguns trabalhadores usam os registros de ponto para pedir horas extras, relatam os advogados, com base em casos em que trabalharam. De acordo com levantamento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), os litígios sobre horas extras representavam de 16% a 19% das ações na Justiça no ano passado.
“A reforma só está reforçando o óbvio. Se você está na empresa e não está trabalhando, não pode cobrar hora extra”, explica Juliana Bracks, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) Direito. Na avaliação dela, no entanto, a edição do texto não resolve completamente os possíveis conflitos. Por isso, afirma que continuará a recomendar empresas que atende a não permitir que seus funcionários fiquem no trabalho após o expediente. “Independentemente do artigo ter destacado isso, o ônus da prova continua do patrão. A presunção é de que quem está dentro da empresa, está para trabalhar. É o extraordinário que precisa ser provado. É aquela ideia de que soldado no quartel quer serviço. Vou continuar orientando a não permanência na empresa após o expediente.”
Funcionários que precisam trabalhar uniformizados também serão afetados pela reforma trabalhista. De acordo com o texto, o tempo usado para trocar de roupa não poderá ser considerado como hora extra, a menos que o empregador exija que a essa troca seja realizada na empresa. Para especialistas, há divergências sobre a regra dos uniformes, uma vez que pode ser considerado que o empregado já está à disposição da empresa no momento da troca de roupa. Há também crítica à extinção da chamada “hora in itinere”, a inclusão do tempo de deslocamento no cálculo da jornada de trabalho.
Hoje, a CLT prevê que o tempo de deslocamento vale como jornada nos casos em que o posto de trabalho é de difícil acesso e o empregador fornece o transporte. “Em alguns itens, o empregado de fato está à disposição do empregador, quando troca de roupa ou se dirige ao posto dentro da empresa”, opina Ivan Garcia, professor de Direito do Ibmec/RJ.
Domingos Fortunato, especialista na área trabalhista do escritório Mattos Filho, avalia que, no caso dos uniformes, a exigência de troca na empresa deve ficar restrita a serviços relacionados a segurança e à saúde. “É o caso de hospitais, por exemplo”, cita o advogado. A restrição em relação a troca de uniformes está no mesmo artigo que define que não contam para remuneração adicional atividades como práticas religiosas, descanso, lazer, relacionamento social. Para esses casos, a recomendação de Fortunado é formalizar acordos.
(Fonte: Jornal do Comércio)